Uma das ideias que mais vão de encontro à assertiva cristã de
que deus é perfeito, onipotente, onisciente e infinitamente benevolente é a
própria questão da existência do mal. Por mal, entenda-se a faculdade humana do
egoísmo, a desigualdade social (muitas vezes fruto desse egoísmo), a opressão
de uns por parte de outros, os preconceitos, assassinatos, crueldade, pessoas
passando fome... todas aquelas coisas que causam demasiado sofrimento às
pessoas, e sobre as quais chegamos a um consenso: são ruins.
Chegamos
então ao cerne da discussão: qual seria a origem desse mal? Dependendo da
resposta dessa pergunta, podemos chegar às mais variadas conclusões. Seria,
basicamente, uma caça ao “culpado” pelo mal que vemos no mundo. Os
não-religiosos dizem que deus é o culpado, pois tem tanto poder e mesmo assim
deixa o mal existir. Religiosos respondem dizendo que deus nos deu o
livre-arbítrio, e temos a capacidade de escolher qual caminho seguir, sendo a
vida baseada em escolhas. Os que escolhem prejudicar o próximo, e agem de tal
forma que acabam causando conseqüências danosas à sociedade, seriam punidos
após a morte, por seu próprio criador.
Detenhamo-nos
por um instante no argumento religioso. Deus cria uma espécie que dominará o
planeta, deixando-a livre para fazer o que quiser. Quer que os homens amem uns
aos outros, o que expressa em seus mandamentos. Abre, através do
livre-arbítrio, uma brecha para que suas criaturas se desvirtuem e tornem a
convivência um verdadeiro caos, o que realmente ocorre em muitos casos – alguns
humanos triunfam sobre outros, sendo injustos e inescrupulosos. Muitos
inocentes sofrem devido ao fato de outros escolherem o “caminho do mal”. A
questão é: o que leva alguns homens à escolha pelo mal?
Se o mal vem da humanidade e de suas escolhas,
podemos dizer que a prática do maligno já está no âmago da personalidade
humana. O mal se encontra “embrionariamente” em algumas pessoas, caso contrário
não ocorreria a escolha por tal caminho. Segundo a doutrina cristã, deus criou
o homem, sendo então o responsável por esta predisposição a fazer o mal. Para
uma melhor explicação, chegamos à analogia
do mp3 propriamente dita.
Suponha um
técnico em eletrônica que fabrica um aparelho reprodutor de músicas, conhecido
popularmente por MP3 Player. Ao
fabricá-lo, o técnico faz com que ele tenha a função shuffle, a qual faz com que o aparelho reproduza qualquer música,
aleatoriamente. Depois de concluída a fabricação, o técnico passa à etapa da
escolha das músicas para armazenar no dispositivo. Ele pode escolher entre
músicas boas e ruins. Coloca as músicas e liga o aparelho na função shuffle, ou seja, deixa o aparelho livre
para tocar qualquer coisa. É fato: só
serão reproduzidas músicas ruins se o técnico inseriu tais músicas na criação
do aparelho.
A analogia
fica óbvia: o técnico seria o criador, o aparelho seria a criatura (ser
humano), a função shuffle seria o
livre-arbítrio e as músicas colocadas seriam as predisposições da nossa
personalidade, podendo ser boas ou ruins. Acabamos ficando sem outra saída: a
responsabilidade seria de deus, mesmo se o mal for fruto do nosso
livre-arbítrio. Disso tiramos uma conclusão: das qualidades que a religião
cristã dá a deus (onipotência, onipresença, onisciência e infinita
benevolência), pelo menos uma ele (se existe) não possui.